Conheça a história da ativista ambiental indiana Vandana Shiva, um símbolo da luta anticapitalista, agroecológica, feminista e pela alterglobalização
Ludmilla Balduino
A pesquisadora e ativista indiana Vandana Shiva é uma das convidadas do Seminário “Agrotóxicos, Impactos Socioambientais e Direitos Humanos”, que ocorre pela terceira vez na cidade de Goiás (GO), entre os dias 10 e 13 de dezembro.
Ela estará presente na conferência de abertura do evento, na noite de 10 de dezembro, e também deve integrar uma roda de conversa na tarde do dia 11 sobre agrotóxicos na América Latina, juntamente com ativistas, advogados e pesquisadores latino-americanos.
Vandana Shiva é uma das vozes mais expoentes na luta por alternativas ao capitalismo. A indiana defende a agroecologia como o ponto de partida para a realização das justiças social, econômica e ambiental. Sua luta vem de berço: nascida em 1952 em Dehra Dun, cidade do norte da Índia, aos pés do Himalaia, quase na fronteira com o Nepal e a China, Vandana é filha de mãe agricultora e pai guarda florestal.
Quando adolescente, nos anos 1970, participou do movimento Chipko, em que mulheres moradoras das vilas do Himalaia abraçavam árvores para proteger as florestas da região contra o desmatamento.
Ao terminar a sua graduação em Física na Índia, Vandana mudou-se para Ontario, no Canadá, para fazer um mestrado em filosofia da ciência, em 1976. Sua tese de doutorado sobre física quântica foi defendida em 1978, também em Ontario.
Vandana começou a participar mais ativamente da luta pela agroecologia ao visitar sua cidade natal e descobrir que a floresta que costumava frequentar quando era criança havia sido derrubada e o rio que passava ali foi drenado para o plantio de uma monocultura de maçãs. Motivada por essa luta em favor da natureza, em 1982, criou a Fundação de Pesquisa para Ciência, Tecnologia e Ecologia (RFSTE, sigla em inglês), cuja primeira sede foi no estábulo de sua mãe, em Dehra Dun.
Respaldada pela Fundação, ela passou a liderar campanhas contra a construção de represas e exploração das florestas do norte da Índia por madereiras. A preocupação de Vandana era com a chamada “Revolução Verde”: um modelo de desenvolvimento econômico para o campo, baseado na mecanização, no uso de sementes transgênicas, fertilizantes industriais e agrotóxicos.
Disseminado a partir dos anos 1960 pelos Estados Unidos, a Revolução Verde surgiu com a promessa de alimentar toda as pessoas do mundo com suas produções de grãos em larga escala – algo que até hoje não aconteceu. Veja um comentário dela sobre esse modelo de agronegócio:
Com o objetivo de criar uma onda alternativa à Revolução Verde, os cientistas da RFSTE criaram um banco de sementes por toda a Índia, e saíram pelo país trocando práticas de agroecologia com agricultores familiares.
O banco de sementes fez tanto sucesso que, em 1991, Vandana criou o Navdanya, um movimento que promove a conservação da biodiversidade, a agricultura orgânica, os direitos dos agricultores, e o cuidado com as sementes criolas no país.
Além disso, foi construída uma escola, a Bija Vidyapeeth (que significa, em tradução livre, “Escola da Semente” ou “Universidade da Terra”), perto de Dehra Dun, cujas diretrizes principais envolvem ensino e pesquisa sobre conservação da biodiversidade e agroecologia. Entre os cursos, que duram em média um mês, há um ministrado por avós que compartilham conhecimentos repassados via tradições orais, sobre plantas, remédios caseiros, formas de cultivo e cuidado com a terra.
Por todo esse trabalho junto a mulheres da terra, Vandana Shiva também tornou-se uma das principais vozes do movimento feminista:
Ela também fundou a Diverse Women for Diversity (em tradução livre: Mulheres Diversas pela Diversidade), uma versão internacional do Navdanya. No site do Navdanya, ela escreve que “Ecologia e feminismo são inseparáveis. E a Diverse Women for Diversity atua combinando os direitos das mulheres com os direitos da natureza, celebrando nossas diversidades cultural e biológica.”
Autora de mais de 20 livros, Vandana também está no embate contra o uso de agrotóxicos, de fertilizantes e de sementes transgênicas na agricultura. Defende o uso responsável da terra: não como exploradores de um recurso inerte, mas como seres que, sendo parte da natureza, comungam com ela de maneira cooperativa, igualitária.
Para ela, a defesa dos direitos da natureza e dos direitos humanos caminham juntos no que se pode chamar de Democracia da Terra: uma democracia viva, que mantém e é mantida por culturas vivas e economias vivas.
Sobre o Seminário “Agrotóxicos, Impactos Socioambientais e Direitos Humanos”
O evento, que em 2018 chega à sua terceira edição, teve sua estreia em 2014. O resultado deste primeiro seminário foi a publicação do livro “Agrotóxicos: violações socioambientais e direitos humanos no Brasil”, que representa um grito de resistência contra o silêncio instaurado a respeito do uso e dos impactos dos agrotóxicos.
A segunda edição do Seminário, realizada em 2016, deu início a um diálogo com pesquisadores e profissionais da saúde da Argentina, além das articulações entre diferentes instituições de pesquisa em todo o território brasileiro.
Nesta terceira edição, a quantidade de pesquisadores de outros países é maior. Além da presença de Vandana Shiva, estão confirmados Fernando Cabaleiro, da ONG argentina Naturaleza de Derechos; Alejandra Crespo, da Cordinadoria por el Medio Ambiente (CODAPMA), da Bolívia; Fernando Bejarano, da Red de Acción sobre Plaguicidas y Alternativas do México (RAPAM); María Isabel Cárcamo Pavez, da Red de Acción en Plaguicidas y sus Alternativas para América Latina (RAPAL), do Uruguai; Perla Alvarez Britez, da Organización de Mujeres Campesinas e Indígenas (CONAMURI), do Paraguai; Marianella Irigoyen, advogada especialista em Direito Ambiental, do Equador; e Carla Hoinkes, da ONG suíça Public Eye.
O seminário é organizado pelo Gwatá – Núcleo de Agroecologia e Educação do Campo, da Universidade Estadual de Goiás (UEG), e tem como objetivo ampliar e fortalecer o debate internacional sobre o uso dos agrotóxicos e sua relação com os direitos humanos e da natureza. Também é de interesse dos organizadores e participantes contribuir com o desenvolvimento científico sobre o tema e fortalecer a inserção dos saberes populares nesse debate.
Para a realização do Seminário, o Gwatá também conta com a parceria da Universidade Estadual de Goiás (UEG); da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA); da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida; da Comissão Pastoral da Terra (CPT); da Diocese de Goiás (GO); da Comissão Dominicana de Justiça e Paz e da ONG argentina Naturaleza de Derechos.
Veja a programação completa do Seminário Agrotóxicos, Impactos Socioambientais e Direitos Humanos
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